MARIE ANNE PÉRICHON DE VANDEUIL E SANTIAGO DE LINIERS Postado em 26/06/2022 Por Deus See More

MARIE ANNE PÉRICHON DE VANDEUIL E SANTIAGO DE LINIERS

Fi-Fiuuuuuu, que mina! Os portenhos da Buenos Aires colonial teriam exclamado – se pudessem – ao ver chegar o deslumbrante e vulcânico Perichon. A beleza dessa mulher, sua conversa encantadora com sotaque exótico e sensualidade marcante, avivavam o pulso dos cavalheiros e provocavam a inveja das damas crioulas. Logo ela foi acusada de ser uma "devoradora de homens", contrabandista e espiã. E a gota d'água foi quando o vice-rei Liniers perdeu a cabeça por ela, e começou uma das novelas mais comentadas da época das Invasões Inglesas.

MARIE ANNE PÉRICHON DE VANDEUIL E SANTIAGO DE LINIERS

Marie Anne Périchon de Vandeuil, mais conhecida como Anita Perichón ou “la Perichona”, nasceu em 1775 na Ilha Bourbon (hoje “La Réunion” no Arquipélago das Mascarenhas), uma antiga possessão francesa localizada no Oceano Índico. Ela pertencia a uma família da elite colonial francesa e muito jovem casou-se com um oficial irlandês a serviço da França, Thomas O'Gorman. Em 1797, a família se estabeleceu em Buenos Aires, onde já estava instalado o tio de Thomas, o médico Miguel O'Gorman, criador do Protomedicato, instituição encarregada de regulamentar as práticas sanitárias na colônia. Chegaram com “grande esplendor”, como se dizia na época, e enquanto o pai de Ana fracassava em sua tentativa de se tornar fazendeiro no Brasil, O'Gorman castelhava seu nome como Tomás e adquiria terras nos arredores de Buenos Aires.

A vida de Don Tomás complicou-se após as invasões inglesas, pois por colaborar com o inimigo foi preso em Luján após a reconquista e, por insistir em oferecer seus serviços ao invasor em 1807, teve que buscar refúgio no Rio de Janeiro. Sua esposa, Anita, ficou em Buenos Aires, onde se tornou amante do “herói do dia” e do novo homem forte de Buenos Aires, Santiago de Liniers, que se tornou vice-rei por decisão dos “vizinhos”. O historiador Vicente Fidel López aponta que seu amante anterior não era outro senão o general Beresford, chefe da primeira invasão inglesa. Ali nasceram as suspeitas, que a acompanharão por grande parte de sua vida, sobre sua espionagem a favor dos ingleses.

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Segundo nos conta Paul Groussac, enquanto Liniers avançava à frente de sua coluna, em 12 de agosto de 1806, ao chegar à Calle de San Nicolás -atual Avenida Corrientes- alguém jogou a seus pés um lenço bordado e perfumado como homenagem ao vencedor. . Liniers o pegou com a ponta da espada e, ao responder à saudação com o lenço levantado, pôde ver a bela Anita e a partir desse momento começou uma relação muito ardente. As relações entre "Madama O'Gorman" e Liniers eram o escândalo da cidade naquela época. Em parte porque aos 31 anos ela não era mais considerada uma mocinha naquela época e uma "dama" deveria ser muito mais discreta. A informal “virreina” instalou-se na casa dos Liniers e mudou-se com escolta, e para horror das senhoras portenhas, até vestiu uniforme militar e andou a cavalo.

O apelido de Perichona, obviamente referindo-se ao seu sobrenome, estava associado na época a María Michaela Villegas y Hurtado, uma notável atriz de Lima que, além de seu grande talento, ficou famosa por seus casos amorosos com o vice-rei do Peru, Don Manuel de Amat y Juniet. , Cavaleiro da Ordem de São João. O adjetivo era um tanto ofensivo porque derivava de "cadela" e "chola". Por sua vez, Liniers preferiu chamá-la de “La Petaquita”.

Segundo um espião do governo português, a mulher “pode fazer o que quiser sobre o espírito dele” e era o “canal adotável para dirigir a vontade” do vice-rei. O boato aberto era que, por meio dele, excelentes negócios eram realizados, graças ao favor oficial; algo que não era novidade na colônia, mas que naqueles tempos conturbados e com o erário esgotado ficou mais evidente.

A situação se complicou ainda mais quando Napoleão decidiu tomar a Espanha e entronizar seu irmão José. A condição francesa de Liniers e "Madama Perichón" os colocou na mira dos ataques. O rico comerciante espanhol e chefe do Cabildo, Martín de Álzaga, viu chegar a oportunidade de se livrar do "francês", e em outubro de 1808 mandou redigir um ofício do Cabildo ao Supremo Tribunal Central em que era lê-se: "Aquela mulher com Quem mora no vice-rei mantém uma amizade que é escândalo entre o povo, que não sai sem escolta, que tem guarda em casa dia e noite, que emprega as tropas de serviço no trabalho de seu propriedade rural, onde passa os seus dias, vice-rei, cuja comunicação nem as insinuações nem os conselhos das autoridades, nem os sussurros nem os gritos do povo conseguiram cortar, aquela mulher, em suma, desprezada e criminosa por todos suas circunstâncias, é o árbitro do governo e até mesmo de nosso destino. Não há nada, por mais injusto que seja, que não seja alcançado e alcançado por meio dele. O compromisso e o dinheiro são agentes muito poderosos para ela. Nada temeroso, e assim se veem monstruosidades no comando, desordens sobre desordens transcendentais entre o próprio povo, em quem os magistrados não podem administrar a justiça porque sua conduta é escusada”.

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A gota que quebrou o lombo do pequeno camelo na tímida sociedade portenha da época foi a intenção da filha de Liniers de se casar com o irmão mais novo de Anita, Juan Bautista Perichón. O vice-rei, deixando de lado suas paixões amorosas e tentando defender seu "bom nome e honra", acusou a amante de reunir conspiradores em ajuntamentos em sua casa, fez-a embarcar e expulsou-a para o Rio de Janeiro, para se encontrar com o marido. A corte portuguesa já havia sido instalada por seus aliados britânicos no Brasil, fugindo da invasão napoleônica, e era o centro das intrigas protagonizadas pela princesa Carlota Joaquina de Borbón, irmã do rei Fernando VII e esposa do príncipe regente de Portugal. . Recordemos que Carlota ambicionava governar as colónias americanas como regente enquanto durasse o "cativeiro" do seu "irmão real", prisioneiro VIP de Napoleão no palácio francês de Valençay.

Em sua casa no Rio de Janeiro, Anita Perichón de O'Gorman continuou com suas tertúlias, onde se reuniam diferentes conspiradores do Rio da Prata, ingleses e portugueses. Diz a lenda que seu novo protetor e amante não era outro senão Lord Strangford, o representante britânico perante a corte portuguesa no Rio; como se diria em tempos mais recentes, um dos principais "operadores políticos" de todo o processo em curso na América do Sul e, sobretudo, o mais ferrenho opositor aos planos da princesa Carlota de se ver dona da situação. Assim, Dona Carlota decidiu que para "intrigar" nas praias cariocas consigo mesma era mais que suficiente, e em 1809 decidiu expulsar Dona Anita.

Presas, secretário de Carlota, conta em suas "Memórias Secretas" que a princípio a princesa lhe pediu que fizesse uma lista de conspiradores na qual não poderia faltar Madame Perichón. Ele teve pena de Anita e contou: “Eu me formei no momento com os detalhes e circunstâncias que a princesa pediu; mas omiti de colocar Périchon nele, porque não há nada pior para quem começa a escrever sobre ela em assuntos semelhantes. Ao ler a lista de SA, ela notou que faltava o nome daquele que ela queria que fosse pesquisado. "E por que", ele me disse, "Périchon não está aqui?" – Porque esta mulher não se mete em tais negócios, e sua situação é tão lamentável hoje, que vale mais a pena que VAR tenha pena dela, do que aumentarmos sua aflição. - Olá! –ele respondeu-, parece que você é um protetor das boas meninas. –Senhora, eu sou um homem; mas eu falei com ela em vida, e se ser uma boa menina nesta ocasião não a favorece, também não deve prejudicá-la, já que não há causa certa para agir contra ela e, acima de tudo, VA poderá fazer o que ela gosta”. Presas conclui: "Não é fácil explicar o ódio e o desgosto com que as mulheres feias olham para as belas, defeito do qual nem mesmo as próprias princesas estão isentas."

Por fim, Anita foi deportada e embarcou em um navio inglês, mas as autoridades espanholas de Montevidéu e Buenos Aires, lideradas pelo vice-rei Cisneros, negaram-lhe permissão para desembarcar. Logo após a Revolução de Maio, a Junta decretou que "Madame O'Gorman poderia desembarcar com a condição de que não se estabelecesse no centro da cidade, mas na fazenda de La Matanza, onde deveria manter a discrição e a reclusão". .

MARIE ANNE PÉRICHON DE VANDEUIL E SANTIAGO DE LINIERS

Ali, a frenética animadora das tertúlias portenhas e paulistas passou os últimos trinta anos de sua vida praticamente confinada. As notícias que recebeu não foram geralmente animadoras, pois desde sua estada em La Matanza deve ter sabido de duas execuções de pessoas próximas a ele: o ex-vice-rei Santiago de Liniers, sua ex-amante, e Camila O'Gorman, sua neta e herdeira .de seu espírito rebelde. Algo demasiado perigoso numa sociedade onde a liberdade sempre foi uma qualidade que suscita suspeitas e sanções.

Compilação de textos e imagens: elhistoriador.com.ar; agêncianova.com; elsoldesantelmo.com.ar; pressreader.com

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